quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Ensaio sobre ensaio sobre a cegueira


Sempre acreditei na máxima de que todo filme lançado a partir da história de um livro nunca será bom porque o que nossa mente recria, é sempre o melhor. Mas achei uma ousadia maravilhosa levar “Ensaio sobre a cegueira” de José Saramago às telonas. O livro é de uma leitura intensa, cansativa, não tem pontuações (ao menos não o que esteve em minhas mãos) e um português rebuscado, contudo, não muito difícil de compreender.

Já o filme, dirigido por Fernando Meirelles, é infinitamente mais brando. Ouvi comentários de que era pesado, perturbador, etc. Entretanto o que vi foi uma versão romântica e apaziguada do pior lado humano. Tenho de reconhecer que o cenário foi muito bem retratado. O hospício onde os cegos ficam em quarentena se aproximou muito do ideal proposto no livro, principalmente o banheiro e os corredores, a destruição e caos nas ruas também. Mas cadê a nojeira? Sim, ela estava lá. Algumas bostas aqui e acolá no chão... Mas quem leu o livro, garanto que esperou muito mais podridão, decomposição, depravação, corrupção, desordem, autoritarismo, descaso e maldade. Elementos fundamentais que faltaram na trama.

A mulher do médico, interpretada por Julianne Moore, permaneceu fiel à minha mente. Imaginava ela loura, acima dos quarenta, de fisionomia determinada e forte; uma mãe, o que acaba se tornando “num mundo de cego onde quem enxerga, não é rainha”. A rapariga dos óculos escuros (Alice Braga) deveria ser mais bonita já que no livro, embora não estejam lá retratadas suas características corporais, dá entender ser mais bela que o mostrado no filme. O primeiro cego (Yusuke Iseya) e a mulher do primeiro cego (Yoshino Kimura) me surpreenderam por serem orientais, todavia, quando o momento do estupro coletivo chegou, entendi porque o marido foi tão categórico em afirmar que sua mulher não se submeteria aos caprichos de outro homem, porque esta só faz o que ele manda. O velho da venda preta (Danny Glover) é negro. Descobri que minha mente manipulada pela “mídia branca” não permitiu por um negro sequer no livro, que dirás no filme. Gael García Bernal, o rei da ala três que detém a comida em troca de sexo e quinquilharias, também me surpreendeu. Este personagem eu imaginava ser alguém velho, gordo, grisalho, enfim, alguém que se parecesse com o papai Noel sem aquela roupa vermelha estuprando mulheres. O rapazinho estrábico é um fofura, ao passo que em minha mente era um menino de aspecto imbecil. E por fim, o médico para mim era mais alto e não tão bonito quanto Mark Ruffalo.

Ensaio sobre a cegueira é um livro que discorre sua mensagem vagarosamente possante. Ensaio sobre a cegueira – o filme, eu diria que é só um ensaio do que pode ser melhor retratado. Para quem não leu nada, a mensagem de que nós somos “aquela parte que não tem nome”, ou seja, o nosso âmago, é passada. Contudo, mais vale ler o livro que ver o filme. Ou ler o livro e assistir o filme. Agora, ver o filme sem ler/ter lido o livro, é perder o prazer de pensar, imaginar e concluir.

domingo, 7 de setembro de 2008

Awake - A vida por um fio


O jovem Clayton (Hayden Christensen) tem uma saúde delicada e precisa de um transplante de coração. Como se não bastasse seu problema físico, há também os emocionais. Seu pai morreu quando caiu da escada de casa e sua mãe possui um temperamento difícil, mas o ama incondicionalmente. Por ter essa relação acirrada, Clay não conta para Lilith (Lena Olin), sua mãe, a respeito da existência de Sam (Jessica Alba), sua namorada mantida em segredo há dois anos. "Awake – a vida por um fio" começa assim, com uma história de amor que nos remete a pensar que Clayton e Sam lutarão até o fim contra a saúde frágil de Clay e a amargura de Lili, mas o diretor Joby Harold nos surpreende quando a cirurgia de Clayton começa.

Com todos os detalhes, o filme trata de “anestesia consciente” que é quando o paciente é capaz de lembrar-se de conversas da sala de cirurgia, não necessariamente com a presença de dor, a chance de isso acontecer é de 0,1%. Entretanto, durante o seu transplante, Clayton não só ouve como também sente dor, bastante dor. Porém sem mover-se um dedo sequer. O momento operatório se torna para nós numa agonia sem fim, narrada apenas pela voz desesperadora de Clay, uma voz que associamos imediatamente á consciência, aquela a qual só nós ouvimos dentro de nossa mente.

Um pouco espírita, a trama nos leva a uma sensação surreal quando Clay sai de seu corpo e tenta se salvar a qualquer custo quando descobre que não passa de uma “peça” nas mãos de médicos antiéticos que tramaram uma cilada a fim de livrarem-se de processos contra imperícia. O filme choca por sair da mesmice de quadrilhas de assassinos, traficantes, ladrões, etc. para uma quadrilha de médicos mau caráter.